O que os médicos não sabem e deviam conhecer sobre Parkinson
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Quando o cardeal Jean-Louis Tauran se dirigiu à
multidão na Praça de São Pedro para anunciar o novo Papa, Francisco, a
emoção do momento deixou para segundo plano um pormenor, que não escapou
ao olhar dos especialistas: os estranhos movimentos de cabeça do
cardeal, acompanhados de algumas expressões pouco naturais. Tauran sofre
de Parkinson, algo facilmente identificável a olho nu pelos médicos
habituados a reconhecer os sintomas da doença e os efeitos da medicação
administrada nestes casos.
A doença de Parkinson é, afirma o neurologista Joaquim
Ferreira, a mais mediática das que integram o "subcapítulo das
patologias neurológicas designado por doenças do movimento", um grupo
que abrange várias perturbações, algumas quase tão desconhecidas quanto
desvalorizadas. O tema vai estar em debate nos próximos dias, com a
realização do Congresso Nacional de Doenças do Movimento, encontro que
arranca esta sexta-feira no Vimeiro e termina no domingo.
O tremor e a síndrome das pernas inquietas são as
doenças do movimento mais prevalentes, refere Joaquim Ferreira. Esta
última patologia, acrescenta, "está claramente subdiagnosticada em
Portugal, pelo que os pacientes "acabam por ser encaminhados para
especialidades que nada têm que ver com o problema", erradamente
atribuído a causas tão díspares como "hérnias, varizes ou fibromialgia".
Se o tremor é identificado por movimentos produzidos
por contrações incontroláveis e involuntárias dos músculos (e não
significa necessariamente Parkinson, como os pacientes temem ao sofrer
os primeiros sintomas), a síndrome das pernas inquietas caracteriza-se
por um desconforto nos membros inferiores quando em repouso, muitas
vezes com queixas de dor, o que "obriga" os doentes a mexer as pernas
com frequência.
"São as pessoas que no cinema cruzam constantemente as
pernas ou aquelas que nos aviões não conseguem estar sentadas e
circulam de um lado para o outro", explica o neurologista. "Aparece nos
adultos, com intensidade variável e na maioria das vezes com sintomas
ligeiros, mas que se vão intensificando ao longo do tempo e com o
avançar da idade". Dados oficiais sobre a incidência da doença em
Portugal "não existem", mas Joaquim Ferreira acredita que estarão
próximo das médias de Espanha ou França, onde esta síndrome afeta 10% da
população.
Ao contrário de outras áreas na saúde, o panorama da
investigação e as expectativas quanto a novas terapias, mais eficazes,
não é animador no que às doenças neurodegenerativas diz respeito, admite
Joaquim Ferreira. "Tem havido muitos falhanços", refere o neurologista,
"a que se soma a própria crise no sector da indústria farmacêutica".
Ainda assim, há uma evolução considerável nos últimos
dez anos ao nível do tratamento de Parkinson: "Conhecemos melhor as
terapias, o que nos permite usá-las também melhor, na melhor sequência e
com as doses mais adequadas. E são inegáveis os resultados da cirurgia
de estimulação cerebral profunda, sobre a qual fui bastante
cético no início".
Os dados do estudo epidemiológico de avaliação da
prevalência da doença de Parkinson, que o congresso apresentará e que
revelou existirem 13 mil doentes, abre um novo capítulo. "Prepara-nos
para ajudar as entidades competentes a fazer o melhor uso dos recursos" e
devolve aos médicos o país real nesta matéria.
"Acreditava-se que Portugal teria uma maior prevalência
da doença, o que não se confirmou, embora seja agora necessário avaliar
a metodologia seguida, pois os dados podem significar que há muitos
doentes institucionalizados e que ficaram de fora das informações
recolhidas", conclui Joaquim Ferreira.
Ouvir os doentes é outra forma de perceber a doença,
diz o neurologista, razão pela qual o advogado Paulo Teixeira Pinto
acedeu a dar no Congresso o seu testemunho como paciente. Falará sobre
"aquilo que os médicos não sabem e deviam conhecer sobre Parkinson".
Cirurgia de estimulação cerebral profunda
A cirurgia de estimulação
cerebral profunda (conhecida também por DBS - do inglês Deep Brain
Stimulation) é uma terapia usada para melhorar os sintomas da doença de
Parkinson. Consiste na implantação de um aparelho, semelhante a um pacemaker
cardíaco, que descarrega estímulos elétricos nas áreas do cérebro
envolvidas no controle dos movimentos. O objetivo é bloquear os sinais
nervosos que causam os sintomas da doença.